CDBs Reinventados em Crypto para o Século XXI 👻🍨

Este artigo faz parte de uma série que visa explicar as peças fundamentais de #DeFi.

No último post discursei sobre como colateralizar seu patrimônio em crypto, a fim de acessar o valor subjacente sem ter que abrir mão de suas preciosas moedas. No caso, usamos um depósito como garantia para um empréstimo, pagando juros muitas vezes menores do que pagaríamos em um banco (principalmente no Brasil!).

E se pudéssemos inverter essa lógica? Ao invés de tomar um empréstimo e pagar juros, porque não oferecer empréstimos e receber juros? Já sabemos que é essencialmente o que os bancos fazem quando você deposita no CDB... eles lhe pagam SELIC+mixaria% ao ano, pegam seu dinheiro e emprestam por 150% ao ano e embolsam a diferença. Ótimo negócio, se você é o banco 😂.

Felizmente, hoje já contamos com plataformas que buscam reinventar esse relacionamento, aproximando o juro pago do recebido. A ideia é manter um spread bem menor para a manutenção da plataforma.

Uma destas plataformas é a cream.finance

Na imagem acima vemos um exemplo de uma destas plataformas, na qual se cobra 23,09% e se paga 15,98% para empréstimos de USDC (juros anuais), um spread de aproximadamente 7%.

Convenhamos que receber 15% a.a. em dólar livre do risco de mercado é um negócio muito mais interessante do que 2,25% da SELIC!

É um negócio tão interessante que apenas no AAVE já se tem 3,7 bilhões de dólares na plataforma

Um detalhe a ser observado é como isso tudo é implementado:

  1. O usuário deposita seu token no smart contract da plataforma;
  2. O token depositado vai para uma pool que junta todos os tokens do mesmo tipo, essa pool é que será disponibilizada para empréstimos;
  3. A plataforma envia para o usuário um token que representa o quanto da pool o usuário tem direito.
aLINK, o token que você recebe ao depositar LINK no AAVE

Esse último ponto é importante, pois esse token representa o direito de sacar (ou seja, o "recibo" do depósito). Sem ele, você não saca😱 - então tome cuidado!

Dito isso, existem plataformas nas quais é possível depositar xTokens e extrair ainda mais valor deles, dependendo da estratégia (e risco)! É a tal defi composability 🍔 e sim, escreverei sobre isso no futuro (spoiler: $YFI).

Algumas perguntas podem vir à mente:

Como sei que não é pirâmide? Bitconnect também prometia retornos maravilhosos...

Toda a operação é regida por smart contracts, ou seja, tudo ocorre de forma transparente e auditável na blockchain exatamente como foi codificado no smart contract - Se você depositou e alguém pegou emprestado, você vai receber, independentemente da vontade até dos criadores da plataforma. Essa característica trustless, permissionless é um dos diferenciais mais atrativos de #DeFi 🚀.

De onde vem o dinheiro que está me pagando juros?

Os juros pagos a quem depositou na plataforma vêm única e exclusivamente de empréstimos tomados, sejam eles repagos ou liquidados. Um detalhe deste formato é que se ninguém tomar empréstimo, a taxa cai a 0% - Para evitar que isso aconteça, deposite stablecoins[1] pois são as moedas com maior demanda por empréstimos.

E se quem tomar o empréstimo não pagar? Fico sem os juros?

Os empréstimos nas plataformas mais comuns (AAVE, cream, compound) são sobrecolateralizados, ou seja, quem toma o empréstimo oferece como garantia mais valor do que toma como empréstimo. A cada bloco, os juros contam (pro rata, centavo a centavo) e se o tomador demorar demais para pagar o empréstimo, o valor devido chegará até sua garantia. A garantia será liquidada para cobrir o valor do empréstimo, assegurando os fundos para os credores. Na prática, no entanto, a pool é imensa e tem sempre gente entrando, saindo, tomando e pagando empréstimos, o que garante liquidez na hora que você quiser sacar.

Qual é o risco?

Essencialmente, o risco é sistêmico, ou na blockchain onde se executam os smart contracts (Ethereum ainda é a principal) ou de algum bug no código do smart contract que permita algum exploit. Para a primeira, vale lembrar que o Ethereum é a maior rede de smart contracts e a segunda maior criptomoeda com capitalização de mercado em $232 bilhões, com B - o que indica que o mercado já a considera como a mais segura. Quanto ao código, sempre se deve utilizar plataformas de código aberto, para que todos possam auditar por si mesmos (ou confiar que outra pessoa irá fazê-lo🤓). Algumas plataformas ainda vão além e contratam consultorias especializadas para certificar seu código. Todas as plataformas linkadas nesse artigo preenchem os requisitos.

A taxa de juros é fixa? Rende de quanto em quanto tempo? Qual é a liquidez?

A taxa paga por quem toma o empréstimo é função do quanto disponível está sendo utilizado. Novamente, se não tem ninguém pegando emprestado, não há juros a serem pagos.

Screenshot da pool de $USDC em 05/04/2021 - 92% de utilização

A periodicidade dos rendimentos é bloco a bloco, o que significa que no Ethereum você verá seu depósito valorizar de 10 em 10 segundos, nem que seja centavos - e a liquidez é imediata! Só não recomendaria transacionar com frequência, pois cada depósito/saque tem os custos da transação na rede do Ethereum. Os custos estão bem elevados (~$100), mas já estão trabalhando nisso, seja com Layer2 ou outra blockchain.

Em relação à profundidade do mercado, depende do que está sendo depositado. No screenshot acima vemos que a pool em particular conta com $342 milhões de dólares, logo depositar ou tirar seu milhãozinho não vai nem fazer cócegas. 😂.

Conclusão

O ecossistema de crypto já se desenvolveu a ponto de oferecer um substituto bem atrativo para o velho CDB, com vantagens imediatamente óbvias (rendimento maior) e outras mais sutis (transparência nas reservas, não depender de ninguém).

Parece pouco, mas é só o começo 😉.


[1]: Criptomoedas com valor atrelado à moedas tradicionais, como o dólar.

Publicado em: 04/04/2021